Violência contra médicos: um indicador da fragilidade sistêmica da saúde
A incidência de violência contra médicos em hospitais brasileiros, especialmente em unidades de pronto atendimento, evidencia uma disfunção sistêmica com implicações diretas sobre a qualidade assistencial. Casos de agressões verbais, físicas e ameaças não são mais exceções estatísticas, mas sim manifestações recorrentes que merecem análise técnica e resposta institucional adequada.
Segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM), os registros de agressões a profissionais da saúde aumentaram substancialmente nos últimos anos, concentrando-se principalmente nas regiões com maior densidade de atendimento público. A centralização da insatisfação do usuário na figura do médico revela uma distorção na percepção social sobre os limites da atuação médica frente à precarização dos serviços.
Imagem ilustrativa: divulgação internet
O médico, enquanto executor de condutas técnicas fundamentadas em protocolos e diretrizes, tem sua função frequentemente interpretada fora do escopo real de responsabilidade, o que contribui para conflitos. Essa tensão é amplificada pela ausência de canais institucionais eficientes de comunicação, acolhimento e mediação entre equipe de saúde e população atendida.
A exposição indevida de condutas médicas em redes sociais e plataformas digitais, frequentemente sem domínio técnico para análise crítica, amplia o risco de julgamento distorcido. Isso tem incentivado uma tendência crescente à medicina defensiva — conduta que, ao priorizar a proteção legal sobre a melhor prática clínica, pode comprometer a resolutividade assistencial.
Estudos publicados em periódicos nacionais e internacionais, como a Revista Brasileira de Medicina do Trabalho, correlacionam episódios de violência no ambiente de trabalho médico com aumento de afastamentos por motivos de saúde mental e rotatividade profissional, especialmente em contextos de alta demanda e baixa retaguarda institucional.
No plano legal, embora dispositivos como o artigo 129 do Código Penal e normas administrativas prevejam punições para agressões, a ausência de protocolos internos eficazes, assim como a morosidade na aplicação de medidas protetivas, enfraquecem a resposta institucional e comprometem a prevenção.

O enfrentamento desse cenário requer uma abordagem técnica, intersetorial e contínua. Algumas medidas prioritárias incluem:
- Implementação de protocolos de segurança institucional com foco em prevenção de conflitos;
- Fortalecimento de políticas de comunicação pública voltadas à educação sanitária da população;
- Incentivo à formação médica com ênfase em habilidades interpessoais e gestão de crise;
- Revisão e aplicação de marcos legais específicos para condutas violentas contra profissionais da saúde;
- Monitoramento sistemático de incidentes e produção de dados para embasar políticas públicas.
A violência contra médicos não deve ser interpretada como fenômeno isolado, mas como sintoma de uma arquitetura assistencial sobrecarregada e mal gerida. O compromisso com a integridade da prática médica e com a segurança dos ambientes de cuidado é, acima de tudo, um compromisso com a eficiência do sistema de saúde e com o direito do cidadão a uma assistência digna e tecnicamente qualificada.
Por Carlos Nathan