7 de setembro de 2024

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Confira 11 orientações para ensinar educação musical a alunos surdos

Professores podem desenvolver atividades que explorem a vibração do som com toda a turma

Por Leonardo Valle (Instituto Claro)

Existe uma relação entre música e surdez que pode ser explorada nas aulas de educação musical e que muitos professores desconhecem. “A música vibra no corpo e conta com uma parte visual, que é a dança. Então, é um mito considerar que o aluno surdo não gosta ou não pode fazer música”, resume a doutora em neurociência e professora do Departamento de Música da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Viviane Louro. “O desafio é adaptar ou pensar atividades coletivas nas quais seja possível a pessoa surda perceber essa vibração”, completa.

Desenvolvimento da musicalidade

Doutora em educação e intérprete na Secretaria de Educação do Distrito Federal (DF), Tatiane Riveiro Moraes de Paula explica que o professor pode focar na musicalização, que é o ensino de princípios da música, ou no desenvolvimento da musicalidade, focado nas habilidades de sensação e de expressão do aluno.

“No caso da criança surda, conhecer instrumentos, a dança, entender ritmo e vibração ajuda no desenvolvimento da musicalidade. Além disso, todos nós vivenciamos a musicalidade da mesma forma, independente se surdos ou ouvintes”, pontua Paula.

A reportagem pediu a três educadores com experiências em educação musical para crianças surdas compartilharem suas experiências. Confira.

1) Use instrumentos graves

Louro conta que instrumentos que emitem sons graves, como tambor e alfaia, fazem com que a vibração seja mais bem percebida pelo aluno surdo. “Durante as atividades musicais, o campo sensorial dos alunos é nosso principal alvo. Assim, trazemos tambores com diferentes peles para eles perceberem como cada uma delas vibra de uma forma distinta”, complementa o coordenador do grupo de percussão formado por jovens surdos “Batuqueiros do Silêncio”, Irton Silva.

2) Se possível, faça atividades em chão de madeira

“Quando há essa possibilidade na escola, faça atividades musicais em um espaço com chão de madeira e com os alunos estando descalços. O som reverbera com maior facilidade nesse piso do que em outros, melhorando a percepção da vibração dos instrumentos”, recomenda Louro.

3) Visão é importante na educação musical de surdos

O sentido da visão é importante para a percepção do ritmo pelo aluno surdo. “Tive uma aula com um professor de música surdo que contou ter entendido o ritmo quando viu uma folha caindo de uma árvore e associou essa cena às batidas do coração”, compartilha Paula.

“Além disso, os professores devem saber que dificuldades para entender o ritmo não serão algo exclusivo de alunos surdos, atingindo alunos ouvintes também. Não é uma regra”, acrescenta.

4) Imitar faz parte do processo

Paula explica que a observação e imitação por parte do aluno surdo em relação aos seus colegas ouvintes também é importante para o entendimento de ritmo. “A imitação não é um processo mecânico ou uma mera cópia, mas uma atividade complexa que envolve diferentes habilidades cognitivas”, destaca.

5) Sinalize a letra da música

Isso pode ajudar o aluno surdo a ter informações sobre o contexto de uma determinada atividade, como, por exemplo, uma dança realizada em uma festa junina.

“O interessante é sinalizar a letra da música antes da atividade de dança, não durante, o que pode prejudicar a concentração do aluno ao desenvolver seus passos”, alerta Paula.

“Assim como a interpretação de uma letra é diferente da fala, o mesmo princípio deve ocorrer na interpretação dela em libras. Precisa ser plástica”, acrescenta.

6) Luzes ajudam a marcar tempos e batidas

Lâmpadas e outros objetos que emitem luzes podem ajudar o aluno surdo a entender o tempo de nota ou uma batida ao estudar ritmo.

Silva desenvolveu um metrônomo – aparelho que mede intervalo de tempo por meio de batidas – com lâmpadas para as atividades do “Batuqueiros do Silêncio”.

“Uso lâmpadas de cores e tamanhos diferentes para trabalhar a intensidade do som, a pausa na frase rítmica, e apresentar de maneira luminosa a duração de tempo”, descreve o educador. “Além das luzes, outra forma de fazer isso é por meio de sinalizações”, completa.

7) Envolva os alunos ouvintes nas atividades

Louro indica ao professor criar estratégias e atividades musicais que integrem também os alunos ouvintes para uma melhor inclusão do estudante surdo. “É útil, por exemplo, uma atividade em que um aluno surdo e um ouvinte se ajudem”, completa.

“Vigotsky fala que, quando compreendemos o desenvolvimento da criança atípica, também atingimos a criança típica. Assim, pensar uma atividade de educação musical que consiga atingir uma criança surda aumenta a possibilidade que todos os ouvintes da classe também sejam contemplados, não o caminho inverso”, opina Paula.

8) Aprenda com o aluno surdo

Paula lembra que o professor deve entender a criança surda como capaz e aprender com ela sobre os melhores caminhos a seguir em uma atividade musical. Ela relata uma experiência com cup song – atividade em que os alunos batucam com copos e usam palmas para cantar uma música – realizada junto a uma estudante surda.

“A música era ‘Como pode um peixe vivo’, e eu idealizei uma sequência em que apresentei a letra por meio de letra, vídeo e sinalizações. Na hora do ensaio, disse que sinalizaria esse texto enquanto a aluna surda fazia o movimento de cup song, que ela já conhecia. Porém, mal começamos e ela já me avisou que não estava funcionando para ela”, compartilha.

“Assim, ela me sugeriu que eu sinalizasse apenas 1, 2 e 3 para ela iniciar o cup song e, depois, que cantasse a música. Ela sabia, pelos movimentos da minha boca, a hora em que precisava parar de batucar ou mover o copo. A atividade deu certo e, no final da experiência, foi ela que me ensinou e me apontou a melhor forma que conseguia aprender”, afirma.

9) Traga a história da música para as aulas

Silva explica que, no “Batuqueiros do Silêncio”, uma das primeiras atividades é uma contação de história sobre como surgiu a percepção da melodia e do ritmo.

“Trago imagens e conto que na pré-história houve a percepção que o ar que passava por um chifre de animal produzia uma melodia. Depois disso que, na Grécia Antiga, a percepção de um barbante fixado em diferentes pontos de uma madeira trouxe noção da harmonia”, diz Silva.

10) Conheça os gostos musicais do aluno

“Antes de simplesmente pensar na aula, pergunte se o aluno surdo já teve alguma vivência com música; se é algo do seu interesse; se ele nasceu surdo ou adquiriu a surdez; se essa é parcial ou total; e se usa aparelhos de audição. Tudo isso interfere na percepção musical”, descreve Louro. “Vale também fazer um mapeamento com diversos instrumentos para ver qual ele percebe melhor a vibração”, completa.

“Não será todo aluno surdo que terá interesse em participar de uma atividade como dança, por exemplo. A autonomia dele deve ser respeitada”, enfatizada Paula.

11) Tecnologia ajuda na percepção da música

Desde 2015 tem se tornado mais populares mochilas e coletes que captam o som de uma música e o transforma em diferentes vibrações pelo corpo da pessoa surda. “Esses aparelhos já são produzidos no Brasil e utilizados em shows e experiências sonoras. Não é um equipamento barato mas, se a rede conseguir adquirir, pode ser interessante nas aulas de educação musical”, finaliza Louro.

Fonte: institutoclaro.org.br

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