Educação e pesquisa: Confira 8 dicas para usar contos de fadas na alfabetização
Gênero literário aborda temas universais e estimula imaginação e compreensão de estruturas narrativas
Os contos de fadas podem ser usados na alfabetização porque proporcionam uma linguagem simples, apresentam temas universais, estimulam a imaginação das crianças e também a compreensão de estruturas narrativas.
Por Leonardo Valle, do Instituto Claro
“Entre as características deste gênero literário estão incluir a tradição da oralidade e abranger outros gêneros, como mitos e parábolas, assim como não ter autor”, resume a doutora em psicologia escolar e do desenvolvimento Luana Carramillo Going, autora do livro “Contos para Escrever-se – Alfabetização por meio dos contos de fadas”.
Imagem: Divulgação Teatro Carlos Moreira
“Os contos de fadas ainda trazem conteúdos existenciais comuns a toda humanidade, como morte, riqueza, miséria e fome. Eles iniciam com alguma tragédia ou desafio a ser superado, e a história não tem continuidade, finalizando no mesmo conto. A exceção é ‘As Mil e Uma Noites’, que é um conto de fada oriental”, descreve a pesquisadora. “Para completar, o final da história é sempre feliz”, ensina Going.
Conhecendo as diferentes versões
Alfabetizar com contos de fadas também exige escolher uma versão dessas narrativas. “Na trajetória dos contos de fadas, cada sociedade foi acrescentando pontos relacionados àquele momento histórico”, destaca a autora.
Going explica que o primeiro escritor a ouvir os contadores de histórias nas aldeias da Europa e compilar esse folclore foi o italiano Giambattista Basile (1566-1632).
“As histórias tinham características pagãs e eram violentas. Por exemplo, a Bela Adormecida dava à luz duas crianças enquanto ainda dormia”, ilustra Going.
O segundo foi Charles Perrault (1628-1703). “Ele viveu na corte de Luís XIV e cortou elementos que não possuíam viés religioso. As mulheres aparecem submissas e não há filhos fora do casamento. Assim, rompe com a oralidade e com as características pagãs”, apresenta.
Na sequência, os irmãos Grimm, Jacob (1785-1863) e Wilhelm (1786- 1859), conhecem uma contadora de histórias anciã e resolvem resgatar os contos de fadas pela tradição da oralidade, escrevendo muitas das narrativas que conhecemos hoje.
“Por fim, temos Walt Disney, que, para criar sua versão cinematográfica dos contos de fadas, necessitava escolher uma versão. Ele optou por Perrault por conta da estética que lembrava Versailles, com castelos e carruagens”, finaliza.
Conheça, a seguir, oito dicas para alfabetizar usando contos de fadas.
1) Escolha o autor e o conto
Conhecer as características e necessidades da classe ajuda a escolher o conto a ser trabalhado. João e Maria, por exemplo, pode fomentar discussões sobre a fome; O Patinho Feio, sobre inclusão e rejeição, entre outros.
“Podemos trabalhar coisas que a classe precisa ressignificar. E toda vez que um herói ganha, por exemplo, é uma forma de trazer esperança”, acrescenta Going, que trabalha alfabetizando crianças e formando professores sobre o tema desde a década de 1990.
A pedagoga Luana Gritten de Souza recomenda usar os contos de Grimm. “Leciono em uma turma de 2º ano e os contos são peças-chave no meu cotidiano, trazendo mensagens de grande importância”, compartilha.
2) Prepare a turma antes de iniciar a história
Going sugere que os alunos estejam relaxados, concentrados e menos ansiosos na hora de escutar a história. “Eu costumo sentar todos no chão, pedir para eles descruzarem os braços e façam técnicas de respiração”, compartilha.
3) Conte a história oralmente e sem o livro
Going sugere ao professor estudar o conto e relatá-lo de forma oral. “Não recomendo mostrar o livro para as crianças porque, na minha perspectiva, é dar o mito pronto sem oportunidade de exercitarem a imaginação”, explica.
“Quando contamos um conto, o narrador some e a criança vira protagonista, transpondo elementos internos para aquela narrativa. Apresentar o livro com ilustrações impede isso. Assim, a história deve ser contada com calma porque é um processo de construção interno da criança: ela que construirá o seu herói, o seu vilão, a sua floresta etc.”, afirma.
Entre os benefícios da contação de história sem o livro está a possibilidade de a criança imaginar personagens de raças, etnias ou biotipos diversos, sem ficar presa a um padrão. “Caso contrário, essa ilustração apresentada ficará na memória como a representação do conto”, recomenda.
“Além disso, assim como ocorreu na história da humanidade, a oralidade antecede a escrita”, justifica.
4) História contada: é hora da roda de discussão
Esse momento é importante porque os conteúdos trazidos pelas crianças serão usados em exercícios de alfabetização. “Você pode perguntar: por que, na opinião deles, João e Maria foram abandonados na floresta; se eles já se sentiram abandonados; quais doces eles gostam e quais comidas não gostam; se já sentiram fome, entre outros”, exemplifica.
5) Escreva as palavras que surgirem nas discussões
“Eu não trabalhava diretamente as palavras do conto, mas o que se desdobrava a partir dele. Em João e Maria, por exemplo, sugiro listar as comidas que eles mencionarem e dividir essas palavras”, orienta.
Para esse momento da escrita, Going trazia um caderno que dizia ser mágico. “Eles poderiam escrever o que quisessem nele, sem medo”.
Além disso, também trabalhava as palavras “difíceis” que apareciam no conto. “É importante não suprimir essas palavras na contação de histórias porque amplia o vocabulário deles, algo que não conseguimos usando uma cartilha, por exemplo”.
“Também é o momento oportuno para apresentar o que é diálogo, o uso de travessão e dois pontos etc.”, acrescenta.
6) Inicie os jogos de decodificação de escrita
Depois das discussões e escritas, Going sugere trabalhar com a alfabetização na perspectiva de Emilia Ferreiro usando jogos. A pensadora da educação propôs que a aprendizagem da escrita é um processo construtivo, no qual as crianças desenvolvem hipóteses sobre como esse sistema funciona, passando por diferentes fases até compreendê-lo.
“Podemos brincar de caça-palavras, forca, ligar e desenhar. Sugiro de oito a dez exercícios de decodificação da escrita”, aconselha Going.
“Trabalhava a montagem de palavras. Por exemplo, a palavra brigadeiro. Eles precisavam descobrir onde ia cada letra”, destaca Going.
Sugestões de atividades podem ser encontradas no produto didático de mestrado profissional em educação “Era uma vez nosso conto de fada: alfabetizando através da literatura”, de Sandra Ferreira Paz e Katia Gonçalves Castor (2021).
7) Trabalhe temas interdisciplinares
Para trabalhar os jogos de decodificação de palavras e escritas, Going sugere explorar temas interdisciplinares relacionados ao conto abordado. “Ao trabalhar Os Seis Cisnes, por exemplo, fizemos uma visita a um orquidário da cidade e listamos no caderno mágico outras aves que ali estavam. O tema também permitiu trabalhar ecologia”, conta.
“Ou seja, é pegar os temas que a classe trouxer nas discussões e amarrar com outras questões presentes no mundo”.
8) Leitura dialogada
Na hora de desenvolver a habilidade de leitura, Souza sugere uma leitura dialogada, prática em que o leitor e os ouvintes interagem, fazendo perguntas, comentários e reflexões. “Cada aluno é responsável pela leitura de uma parte do enredo”, recomenda.
“Outra possibilidade é a dramatização desses textos, por meio de teatros ou fantoches”, finaliza.
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Fonte: institutoclaro.org.br
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